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SÊMELE, ZEUS E HERA

14/10/2012 22:40

 

Em seu livro, Sêmele, Zeus e Hera, o papel da amante no triângulo amoroso, Hans Jellouschek, psicoterapeuta alemão dedicado à terapia de casais, fala sobre os triângulos amorosos, sobre o papel da amante como cúmplice e como fator de equilíbrio, até que, Hera ( esposa ) descobre tudo.

 

 

Conta a história que “ Zeus, o pai dos deuses, amou a mortal Sêmele, filha dos reis tebanos Cadmos e Harmonia. Disfarçado sob a forma humana, uma relação clandestina. Mas o caso foi descoberto pela deusa Hera, esposa legítima de Zeus. Enciumada, ela tramou vingança: tomou a forma da ama de Sêmele, entrou despercebida no palácio real e insinuou a Sêmele que ela ganharia honras celestes se convencesse Zeus a mostrar-se em sua forma divina. Sêmele caiu na armadilha. E persuadiu a Zeus a lhe prometer que lhe satisfaria um desejo secreto. Zeus concordou e ela então exigiu vê-lo em sua verdadeira forma. Zeus, comprometido por sua palavra divina, na visita seguinte que fez aos aposentos de Sêmele mostrou-se paramentado com os símbolos de seu poder olímpico: nuvens, a chuva, os ventos, o trovão e seu raio fulminante. Ela não suportou esse poder e foi fulminada pelo relâmpago. Do ventre dela, no sexto mês de gravidez, Zeus extraiu a criança e enxertou-a na própria coxa, onde a manteve até seu nascimento. Essa criança foi o deus Dionisio, que libertou Sêmele dos infernos e com ela, tornada imortal, ascendeu aos céus dos deuses”.

Segundo, Hans, ”não há dúvidas que de que Zeus-Hera-Sêmele não participam de um triângulo qualquer, mas sim de um triângulo arquetípico que aflora e se faz atual por trás de muitas das nossas histórias de triângulos “terrestres”. Com frequência, o triângulo amoroso torna-se um tabu e é moralmente condenado ou, ao contrário, é declarado um caso normal. Em qualquer dos casos fica faltando uma discussão sincera. O “ conservador”, evita a discussão através do estabelecimento da culpa e do dever moral. A amante ou o marido são simplesmente culpados e ele, o homem, precisa voltar para sua família ( ou guardar melhor o segredo). Em resumo o homem “traí”, “ se afasta”, “ pula a cerca”. A amante existe como objeto de desejo e das necessidades do homem, ou sedutora irresponsável. Em paralelo, encontramos hoje cada vez mais um tratamento “ progressista” de tolerância ao triângulo amoroso. É cada vez mais frequente o triângulo ser aberto e até mesmo discutido- pelos três envolvidos. Permitem relações extraconjugais ocasionais ou até duradouras, e encontramos até mesmo a tentativa mais diferente de viverem os três juntos, em paz. Às vezes tenho a impressão de que assim como os “moralistas” simplificam a questão com seu julgamento do tipo preto no branco, o mesmo fazem os “ tolerantes” com sua liberalidade. Essa última é, se examinarmos bem, tão cruel para com as necessidades próprias e dos outros quanto o rigor moral. E fica, da mesma forma, apenas na superfície. O resultado final em ambos os casos é , com frequência, cinismo, resignação e frustração. O objetivo deste livro é que cada um de nós travássemos  conhecimentos sobretudo com a Sêmele, Zeus e Hera dentro de nós.

Trecho da carta a Hera

Hera, venceste a batalha. Sêmele foi fulminada e tu o tens de volta, o teu Zeus. Mas será que realmente o tens de volta? Ele voltou para casa - mas não por amor, voltou por medo e resignação. Aos olhos dele, tu o forçaste a destruir Sêmele. Ele vai se sentir ofendido e planejar vingança. O que ganhaste, afinal? Talvez tempo. Sim precisas de tempo para poder curar as feridas que esse caso de amor infligiu á tua alma. E quando elas estiverem curadas, o que terás ganho?

Hera, suplico-te: agora que tua rival, Sêmele, está morta, não a deixes morrer na tua consciência. O que fascinou Zeus em Sêmele foi, precisamente, sua capacidade de entusiasmo, sua fantasia, seu desejo terno e fluido e sua dedicação. Qualidades do amor maduro, da feminilidade madura. O que foi feito dessas qualidades em ti?... Na verdade precisavas juntar forças com sêmele, na verdade precisavas aceitar Sêmele em ti, desdobrar Sêmele em ti. Claro que de teu próprio jeito, do que correspondesse à tua idade e às tuas habilidades... Não podes fazer isso porque fantasias de vingança te dominam quando pensas nela? Entendo que a dor daquilo porque passaste, e a dor de estar teu relacionamento com Zeus há tanto tempo morto, é grande demais para ser examinada. Fúria, ódio e vingança te ajudam a protegeres a ti mesma. Mas não fica aí parada. Deixa a dor sair. Pois essa é uma dor que te faria terna e amorosa, que poderia despertar a Sêmele dentro de ti.

Sêmele precisa entrar em tua vida para que não mais te feches em teu reino matriarcal e nele te cristalizes e te isoles. Sêmele é tua chance!

 

Trecho da carta a Zeus

Voltaste a teu ninho de amor no olimpo natal. A ordem foi restabelecida. Os “ negócios de estado” voltaram a ser tratados de modo regular. Todos os que tiveram conhecimento do caso respiram aliviados. A catástrofe foi evitada. Ela venceu e tu te submeteste. Como vai ser daqui para a frente?... Zeus, receio que agora que tudo está acabado, logo voltes a ser o que eras antes e que os velhos jogos de guerra entre tu e Hera recomecem... Com ela não se pode viver de outro jeito, dizes, é preciso brigar para não ser pisoteado... Com Sêmele tudo era diferente. Com ela aprendeste a te conhecer por um outro ângulo, com ela te tornaste carinhoso, fantasioso, jovem. Mas será que é apenas por causa de Sêmele que despertaste para a vida- e apenas por causa de Hera que tudo havia morrido dentro de ti? E o que é exatamente por causa de ti mesmo?

O que me surpreende é que vives tua paixão e tua dedicação apenas no segredo. Ès um grande jogador de esconde-esconde em teus casos amorosos, te dissimulas por trás de todos os disfarces possíveis- como se teu amor jamais pudesse andar à luz do dia... Por que nunca discutiste o assunto com Hera? Foi impossível? Não podias te aproximar dela? Onde foi parar teu poder, Zeus, assim de repente? Tu o fazes - dizes - mas é inútil... É realmente Hera quem te domina – ou acaso não és ainda dominado pela possessividade e pela moral de tua mãe, que não aceita que seu garotinho seja subjugado pelo amor e dedicação a uma outra mulher com todo seu corpo e todo seu desejo? Na confrontação com Hera sobre desejo, dedicação e sexualidade, te libertarias de tua mãe e te tornarias, diante de Hera em teu íntimo, um homem!... O Dionísio de Sêmele, esse poderia transformar a tua vida, teu mundo, teus relacionamentos. O que significa teres extraído Dionísio do ventre de Sêmele e o enxertado em tua coxa? Será que significa que, através do amor de Sêmele, trouxeste o novo para tua vida, o recebeste em ti e através dele te transformarás? Duvido que penses assim.

 

 Trecho da carta a Sêmele

O mundo todo está feliz que o conflito tenha terminado com a desintegração do triângulo amoroso. Ninguém pensa em ti, em como estás passando – assim imaginas. Amantes não tem direitos e quando pensam poder reivindicar algo, ficam para trás. Aconteceu contigo e agora sofres as consequências... Mas, de todo modo, não deves esquecer o que construísse com tua vivacidade, tua intensidade e tua paixão. Conseguiste abrir e suavizar um homem endurecido como era Zeus, tão voluntarioso e racionalista. Despertaste em Zeus o entusiasmo e o êxtase do amor... Agora Zeus carrega Dionísio em sua coxa ( semente de um mundo totalmente diferente, um mundo mais alegre e cheio de paixão que pulsa ao ritmo do ciclo natural de expansão e contração). O que Zeus vai fazer com essa semente é uma outra questão. Mas despertaste nele o desejo. Ele sabe agora, e para sempre, mesmo que o negue, que seu coração não é suficiente para a riqueza e a segurança que lhe deste. Isso construíste, Sêmele, e não deves desvalorizar... Precisas agora de tempo, e podes aproveitar o tempo. Para ti. Quando novamente emergires das profundezas, será decisivo que tenhas refletido sobre o que aconteceu e aprendido tua lição. Isso leva tempo. Caso contrário, repetirás a mesma história e serás novamente fulminada... Desconfio que, para ti, um relacionamento do qual nada resultasse era importante por uma outra razão. Zeus não permanecia contigo. Ele sempre partia, ia para Hera, ia para seus “ negócios de Estado”. Podias ter certeza: “Ele não vai me tirar o ar que respiro”; Não era exatamente essa a condição essencial para que pudesses descobrir as riquezas de desejo e amor que estavam latentes dentro de ti?... Acredito que isso era muito, muito importante para ti, Sêmele. Não devias jamais esquecer o que tu eras, a mulher que revelou tanto amor e tanta vivacidade – e o que tu és, que tudo isso realmente te pertence e permanece em teu ser, mesmo que agora tudo te pareça queimado e ressecado.

O livro é maravilhoso, muito rico, porém  está esgotada a edição do mesmo, eu coloquei apenas uns trechos.

TEXTO: trechos do livro de Hans Jellouschek, SÊMELE, ZEUS E HERA. O papel da amante no trângulo amoroso. 

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